sábado, 16 de abril de 2016

A "democradura" brasileira

     O  escritor  uruguaio  Eduardo  Galeano  costumava  usar o termo "democradura" para definir os regimes liberais ocidentais contemporâneos, ou seja, regimes representativos em que há eleições, separação de poderes e processos formais de governabilidade. No entanto, tais regimes são, no fundo, absolutamente autoritários, já que controlados por grandes corporações e uma oligarquia bilionária que constitui o jet set mundial, pratica todas as contravenções para não pagar impostos e mantêm sua riqueza salvaguardada nas Suíças, Ilhas Cayman ou Jerseys da vida, paraísos dos grande corruptos do mundo que os países de maior peso político cinicamente nada fazem para combater.
     Nestes  últimos  anos  as  notícias  do  Brasil,  onde  com efeito jamais tivemos democracia, estão expondo a podridão de nossa "democradura". Às vezes a impressão que se tem é a de que estamos vivendo um carnaval, uma espécie de mundo às avessas. Chega a ser engraçado ver, no noticiário, as figuras mais corrompidas representando o papel de paladinos da moralidade, falando alto com a eloquência de seus dedos em riste. Enquanto isso, as pessoas comuns são as mais afetadas pela crise econômica criada por esses irresponsáveis e agravada pela atitude de grupos midiáticos da mais extrema grosseria. Há uma queda visível na qualidade de vida no país, nossas cidades estão cada vez mais desconfortáveis, nossa infraestrutura está muito aquém daquela que se espera de um país que se ufana de ser a sétima economia do mundo.
     Seria  bom  se  a  exposição de todas essas misérias, que envolvem todos os partidos e muitas figuras proeminentes da política brasileira, levasse a um debate intensivo sobre reformas como as dos sistemas político, tributário, judiciário, legislativo, previdenciário, educacional, de saúde, agrário; que se rediscutisse os privilégios da casta de políticos e se buscasse formas de se tomar decisões envolvendo a participação direta dos conjunto dos cidadãos. Mas nada disso parece estar na pauta neste momento em que o golpismo retorna irascível, neofascistas saem do armário e um partido que aglutinou esperanças de transformação do país sob sua liderança degenerou-se na prática do que há de pior na política brasileira.
     Essas  indecências  todas  estão  sendo  esfregadas  todos os dias em nossas caras, estão na televisão nos horários em que as criancinhas estão acordadas (sem sequer faixas de proibidas para menores). Através delas se transmitem os valores da esperteza, do individualismo, da ganância, do salve-se quem puder, valores abomináveis dos quais desejo vê-lo muito distante. Sempre busquei estimular em você a generosidade, a preocupação com os outros, o respeito pela dignidade de cada um e pelo patrimônio de nossa comunidade. Jamais seja cínico por que muito o são. Cresça consciente dos problemas do país, que você poderá enfrentar simplesmente realizando com honestidade aquilo a que vier a se dedicar, partilhando com os outros a sua vida e o que vier a conquistar. Tudo isso, que parece óbvio, precisa ser dito num momento em que a infâmia desfila triunfante por todo lado.

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