quarta-feira, 30 de abril de 2014

Sem notícias

     Há várias semanas não tenho nenhum contato com você. É verdade que estive em viagem por um período relativamente longo, mas mesmo antes eu vinha tentando alguma comunicação, não conseguindo encontrá-lo. Enviei-lhe diversas mensagens que ficaram sem resposta. Remeti-lhe cartões-postais de lugares por onde viajei, mas nunca soube se eles chegaram a suas mãos.
     Provavelmente lhe está sendo negado o direito a utilizar o telefone e o computador que lhe dei para que possamos ter um mínimo de contato. Não bastassem todos os achaques que já tive de enfrentar, ainda tenho de passar por esse tipo de coisa. Ah, se eu estivesse aí!

domingo, 27 de abril de 2014

Com a Tailândia no coração


     Partirei hoje de Bangkok para Londres após cerca de vinte dias entre a Tailândia, o Vietnã e a Malásia. Muito especialmente vou me lembrar da Tailândia, que é tão bonita e possui um povo muito delicado e bastante discreto. Nos meus primeiros dias aqui, fui visitar o Grande Palácio dos antigos reis do país, que é muito impressionante em suas formas e suas cores. Simplesmente perambular por lá é uma aula de resoluções arquitetônicas brilhantes com as quais não estamos acostumados. Cada detalhe do imenso palácio foi muito bem planejado e bem executado ao longo dos séculos.
     Há poucos dias, estive também na cidade de Ayutthaya, ex-capital do país, destruída pelo exército birmanês em 1767. As ruínas dos muitos e monumentais templos budistas do local contam a história de uma época de ouro no reino de Sião. Foi um passeio para ficar na memória, mas tive de ser muito resistente para suportar um calor de 40 graus e muito sol, pois esta é a estação mais quente do ano na Ásia.
     Realmente espero que você tenha a oportunidade de viajar e ver coisas assim ao longo de sua vida, pois nos tornamos mais flexíveis e menos preconceituosos ao verificar como outras sociedades encontraram soluções diferentes das nossas para organizar a vida e como tais soluções funcionam bem. Definitivamente nossos valores não são os únicos nem os melhores para todos. São apenas os nossos valores. Mas concordo que parte deles, aqueles que dizem respeito à dignidade e ao respeito aos direitos humanos, podem ser universalizados.
     Retornarei à Europa com a Tailândia no coração.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

Uma experiência no Vietnã



     Acabo de passar cinco dias na cidade de Hanói. Fiquei impressionado com o caos do trânsito, a bagunça nas calçadas e a quantidade colossal de motocicletas. Mas também fiquei muito impressionado com a gentileza das pessoas, a culinária vietnamita, a complexidade do Vietnã e sua história milenar e cheia de grandes eventos, inclusive com o país derrotando em guerras inimigos muito mais poderosos militarmente nos anos 1950 e 70, sob a liderança do grande Ho Chi Minh. Também me chamou a atenção o belo Templo da Literatura. Jamais imaginei que existisse um.
     Esta foi minha primeira experiência num país socialista. No entanto, trata-se de um socialismo em que grandes empresas produtoras de eletrônicos, roupas e sapatos exploram a mão de obra barata ali disponível, um regime que permite a existência de bairros onde habitam pessoas privilegiadíssimas e estabelecimentos de luxo de acesso exclusivo à elite do país. Enquanto isso, a grande maioria das pessoas é muito pobre. Mas lá está todo o aparato repressor da ditadura pronto para massacrar quem se opuser ao status quo. Me parece que definitivamente não era isso o que Ho Chi Minh sonhou para seu país. E não há dúvida de que esse socialismo burocrático de base soviética, apesar de sua grande importância histórica como alternativa às  iniquidades do capitalismo, é um grande fracasso e um anacronismo nos poucos lugares onde ainda persiste. As portas abertas para a corrupção e a ganância pelo poder estão presentes da mesma forma que no capitalismo, com o agravante de não poderem sequer ser denunciadas e investigadas. Isso não quer dizer que não tenhamos de buscar uma alternativa ao regime capitalista, que coloca o dinheiro e as coisas acima das pessoas.
     No penúltimo dia em Hanói, assisti a um espetáculo de marionetes do qual você iria gostar. Os bonecos são muito bem construídos e encenam pequenos esquetes sobre uma poça d'água, com uma música de sonoridade muito distinta daquela a que nossos ouvidos estão acostumados.
     Que a vida também lhe permita viajar por este mundo, admirar a riqueza da cultura dos homens e tornar-se consciente de que há muitas alternativas válidas à forma como organizamos as coisas em nossa própria sociedade.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Cruzando o mundo

     Amanhã partirei para a Tailândia, indo depois para o Vietnã. Estou muito animado, pois esta será a primeira vez que irei de fato ao Oriente, após ter apenas pisado do lado de lá quando fui a Istambul. Tenho a expectativa de uma grande experiência, com sons, sabores, paisagens, pessoas e costumes muito diferentes. E será também o lugar mais longe de casa e de você onde já estive. Pensarei muito no meu menino no outro lado do planeta, onde estarei aprendendo muitas coisas novas. Retornarei cheio de novas histórias para lhe contar, de novas fotografias para lhe mostrar, o que para mim é muito motivador.

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Crianças abandonadas


     Acabo de assistir ao filme Capitães da Areia, baseado no romance homônimo de Jorge Amado. Saí pensando nas circunstâncias em torno dos muitos meninos abandonados que tenho visto em minhas viagens pelo mundo, para não falar na situação daqueles que realizam trabalhos pesados e perigosos ou chegam mesmo a atuar em atividades degradantes como a prostituição ou o tráfico de drogas. Num país de cidadania precária como o Brasil, infelizmente a realidade descrita pelo romancista baiano nos anos 1930 é mais atual que nunca. Na área central de uma cidade como São Paulo, por exemplo, tal realidade pode ser testemunhada em seus aspectos mais sombrios.
     Ao ver especialmente crianças e velhos abandonados pelas ruas, me sinto também responsável por eles, diminuído em minha humanidade e envergonhado de nossa espécie. Isso é ainda mais grave numa época superprodutiva como a nossa. 
     Jamais imaginei meu filho tendo de enfrentar sozinho a maldade e as misérias deste mundo sem ter sequer um mínimo de maturidade para isso. Você está crescendo dentro dos padrões da classe média paulistana, tendo tudo de que necessita, o que é muito justo. Fico feliz pelo fato de o dinheiro que lhe mando todo mês estar sendo usado para garantir o seu bem-estar. Porém nunca se esqueça de que só teremos uma sociedade minimamente equilibrada e segura se corrigirmos essas infâmias. Onde quer que você venha a atuar, jamais se conforme com essa realidade criada ao longo de nossa história excludente por essa elite vagabunda que ainda está no comando do país. É contra os valores dessa canalha que devemos lutar.