sábado, 5 de setembro de 2015

Ainda o horror

     Agora  há  pouco  eu  estava  ouvindo  pelo  rádio um programa chamado "Manhã com Bach", buscando algum alento por meio da beleza em meu compositor favorito após escrever ontem sobre o garoto sírio afogado no Mar Mediterrâneo pela indiferença de todos nós. Já pelo fim do programa resolvo entrar no site de um jornal de São Paulo, para saber do que está se passando no Brasil. Como se a carga de imagens chocantes desta semana já não fosse insuportável, recebo como que um soco no estômago ao ler a notícia e assistir a um vídeo do que aconteceu na tarde de ontem nas escadarias da Catedral da Sé, no centro de São Paulo. 
     Um  criminoso,  portando  um  revólver,  fez  uma moça refém no local, agredindo-a seguidamente. Durante a ação, ele deu várias oportunidades para que a polícia resolvesse a situação extrema que tinha diante de si com um tiro que o matasse de imediato. No entanto, isso não aconteceu, e um homem da multidão invadiu o local e tentou lutar com o bandido, sendo alvejado por este no peito. Na confusão, a moça escapou, e, em seguida, o criminoso foi executado por vários tiros dos policiais. As duas mortes foram não somente um teatro para quem passava pela praça, como um espetáculo de mídia, tendo sido transmitido ao vivo pela tv e fazendo a alegria dos vampiros que apresentam programas pseudojornalísticos de fim de tarde, em que dão vazão ao pior sensacionalismo, urrando as opiniões mais reacionárias e fascistas para os cabeças de vento que os assistem.
     Espero  que  você  não  tenha  estado diante da televisão quando esse horror aconteceu, pois os outros canais não devem ter perdido a oportunidade de também exibirem ao vivo esse show da vida. Todos se lembram do caso do ônibus 174, no Rio de Janeiro. As imagens chocantes desta semana estão aí, sendo esfregadas em nossas caras até nos cansarmos, devendo ser substituídas por outras dentro de alguns dias ou semanas.
     Penso  agora  numa vez em que o levei ao centro de São Paulo, há alguns anos. Entre outros lugares, visitamos a catedral e sentamo-nos exatamente em suas escadarias, para descansar por alguns minutos. Poderíamos, então, ter sido espectadores daquele teatro macabro ou mesmo vítimas dele. O pior é saber que isso está acontecendo todos os dias pelo país, que a segurança pública é o grande fracasso de todos os níveis de governo, que esses fatos são excrescências lógicas e necessárias de um sistema social tão iníquo como o nosso. 
     Escrevi  ontem  que  a  imagem  do  menino  Aylan  morto daquela forma era uma prova de que a humanidade fracassou. Detesto pensar assim, cheio de desesperança, tristeza e desilusão. Porém os fatos estão aí, monstruosamente avassaladores.

Nenhum comentário: