Tenho em algum lugar na memória de meu computador um pequeno filme de quando você tinha apenas dez ou onze meses. Deitado num carrinho, ao ouvir meus passos no corredor da casa, há a pronúncia de um incerto "papa". Quando chego, há novamente a pronúncia de um "papa" com a primeira sílaba mais forte. Por fim, você me estende os braços e pronuncia novamente o "papa" em tom suplicante, para que eu o pegue. Através do uso da primeira palavra que você falou, em pouco tempo já estava empregando entonações para supor, confirmar e pedir... com apenas uma palavra.
Hoje você possui uma linguagem muito desenvolvida e muito variada. Lê bastante, escreve bem e já está estudando línguas estrangeiras. Sei que evita sempre o palavrão e a vulgaridade. Na semana passada, tive uma ideia do quanto está fazendo bom uso das palavras para organizar sua vida, influenciar pessoas e navegar através da complexidade deste mundo. Como às vezes você passa muito tempo sem fazer contato, acabei lhe passando um tremendo esculacho. Preferi fazer isso por meio de uma carta virulenta. Dias depois recebo uma resposta que me desarmou:
Querido pai,
Recebi sua carta e, sim, assumo meu erro.
Estou muito triste porque não pude te ver este ano. Assumo meu erro de não ter conversado ultimamente com você, mas gostaria que soubesse que te amo mais que qualquer pessoa no mundo, porque sei que, sem você, não teria existido.
Desculpe por minha falta de respeito. Espero que eu possa recuperar a confiança perdida com o tempo.
Um beijo do filho que nunca vai te esquecer,
Arthur
Não bastassem a pureza e a dignidade das ideias, lá estão a clareza, a concisão, a fluidez, o tom e o ritmo corretos, a argumentação coerente, a pontuação perfeita. Como não perdoá-lo?
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