domingo, 18 de setembro de 2016

O tempo da infância de cada um


     Fui  um  menino  que  cresceu  brincando  nas  ruas, numa cidade do interior de Minas. Aquela onde eu morava tinha  o sugestivo nome de rua Passa Tempo. Hoje ela está localizada num bairro próximo da área central, mas naquela época ficava na periferia extrema de Divinópolis, que era muito menor do que é hoje. Ao fim daquela ruazinha curta, começava uma região com mato e algumas pequenas fazendas. Havia tranquilidade e segurança nos espaços públicos e toda uma vida comunitária por todo lado. Eu jogava futebol todos os dias depois das aulas, soltava papagaio, descia ladeiras em carrinhos de rolimã. Tinha bastantes amigos e a proteção de minha mãe, que sabia de tudo o que se passava na vida de seus três filhos. Tínhamos sempre um cachorro ou um gato, ou os dois ao mesmo tempo. Era um menino pobre, mas vivia muito bem por fazer parte de um mundo que me acolhia e me respeitava.
     Você  vive  hoje  numa  das  maiores  cidades  do  mundo, possui uma quantidade enorme de roupas, sapatos, brinquedos e toda uma parafernália eletrônica. Não socializa-se o bastante nem mesmo com as pessoas do condomínio onde mora. Não pode nem pensar em brincar nas ruas, por causa da violência e da insegurança que tomaram conta do país e que são ainda mais intensas nas cidades grandes. Nunca houve um animal no seu apartamento e sinto que você tem muitos momentos de solidão em seu quarto. Não desejo fazer uma comparação entre a minha infância e a sua, que tem muitos aspectos melhores que a minha. Por exemplo, sua educação escolar é bem melhor que a que tive, você já sabe nadar muito bem, tem aulas de violão e taekwondo, possui uma desenvoltura com as novas tecnologias que eu não tenho. Além disso, tem acesso a dentista, psicólogo e bons hospitais sempre que precisa. Nenhuma das duas infâncias é melhor que outra. São apenas diferentes e fazem parte de contextos históricos e sociais distintos.
     Em dezembro, quando eu voltar ao Brasil, quero levá-lo para passar ao menos duas semanas em Divinópolis, na casa de minha mãe. Quero que você viva um pouco da minha infância e quero também viver um pouco da sua. Vamos fazer muita coisa juntos.

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