quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Uma página de Kafka

     E  eis  que  por  acaso,  fazendo  uma busca na internet a propósito de outro assunto, descubro que no dia 13 de janeiro deste ano foi aberto um processo de natureza criminal contra mim no fórum de Santo Amaro e Ibirapuera, em São Paulo. No mês passado, quando eu estava na casa de minha mãe, contratou-se um advogado - esse piolho dos conflitos humanos - para que eu fosse obrigado a assinar um documento autorizando que você seja levado ao exterior a minha revelia. Tudo indica que a juíza, certa Dra. Sirley sem doutorado, é uma dessas feministas para quem todo homem é um canalha. O processo foi julgado de maneira sumária, sem que eu sequer tomasse conhecimento dele, e a sentença foi expedida automaticamente, dando-me, sem que eu fosse informado da coisa, um prazo de cinco dias não para me apresentar ali e discutir o problema, mas intimando-me a comparecer ao dito fórum e assinar a autorização. Como não compareci, expediu-se um documento que autoriza, de maneira legal, sua saída do Brasil sem meu consentimento.
     Diferentemente  do  que  acontece com você quando aludo a sua beleza, não houve nenhum pudor e nenhum rubor ao se dizer mentira para a Justiça, já que se declara na intimação que me encontro "atualmente em lugar incerto e não sabido". Nem as correspondências que lhe mando com meu endereço em Londres claramente escrito abaixo de meu nome como remetente, nem o endereço de meu escritório em meu perfil no site da universidade onde trabalho, nem o aviso prévio de que estaria naqueles dias na casa de minha mãe são suficientes para que o lugar onde me encontro seja certo e sabido. Mas a pensão que lhe pago mensalmente, é óbvio, tem origem certa e sabida.
     Essa  pérola  de  baixa jurisdição foi publicada no Diário de Justiça do Estado de São Paulo e agora ficará eternamente disponível na internet. E você poderá ser levado para fora do Brasil sem que eu seja consultado. Em outros tempos admito que cheguei a considerar a possibilidade da violência para lidar com essas manobras. Hoje me esforço para assumir uma serenidade de Buda adormecido, exercitando o desapego e mesmo certa indiferença. 
     Viver longe do Brasil me faz sentir como se eu fosse um aleijado. A despeito das coisas que tenho aprendido e dos momentos de alegria que acontecem por aqui, vivo sempre como se carregasse uma pedra dentro do peito. Mas coisas como esse processo têm me feito atravessar já vários anos nesta forma de exílio em parte escolhido, em parte imposto. E nele ficarei até não suportar mais. Ou até desaparecer em lugares mais longínquos.

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