sábado, 15 de novembro de 2014

Futebol menino


     Fui  hoje  cortar  o  cabelo  na  região do Wandsworth Common, onde morei por um breve período em meados do ano passado. Ao cruzar o parque na manhã fria de outono, vi que vários grupos de meninos mais ou menos de sua idade se preparavam para jogar futebol. Naquele momento, pensei em duas coisas. Em primeiro lugar, imaginei que se você estivesse ali ficaria animado e muito falante. E jogaria muito melhor que os inglesinhos, especialistas em chutões e correrias. Sei o quanto você tem boa técnica e habilidade com a bola. Faria grandes jogadas e muitos gols, e eu ficaria orgulhoso de você. 
     Mas  ao  passar  por aquele  gramado tão bem cuidado, pelos campos com traves e marcações, técnicos e todo um suporte de instrutores, muitas bolas de primeira categoria, meninos já equipados como jogadores profissionais, pensei em minha própria infância e em como comecei a jogar futebol no campinho de terra vermelha do bairro São Sebastião, em Divinópolis (que nem sei se ainda existe), quase sempre descalço, com péssimas bolas de borracha, solto e sem instrução de técnico, exposto a bate-bocas e brigas relativamente frequentes. Somente um pouco mais tarde entrei para um clube, ainda precário, onde passei a disputar campeonatos e a sonhar em ser jogador profissional.
     Você  faz  parte  de  outro  tempo,  de  outra realidade cultural e mesmo espacial, possui muito melhores condições materiais do que eu tinha na sua idade. Me alegro que as coisas sejam assim. Mas é sempre uma felicidade quando vejo nossas muitas fotos juntos, com você ainda bem pequeno, no campinho da Sidil, perto de onde minha mãe possuiu uma casa há alguns anos. Ali você de fato começou a jogar, e eu fui seu instrutor nos fundamentos básicos do jogo. 
     Por causa das circunstâncias da vida, atualmente só o encontro duas vezes por ano, quando vou ao Brasil. É sempre uma felicidade levá-lo para o campus da USP, onde passamos algumas horas jogando juntos. É como se isso nos resgatasse da saudade e da vida que estamos perdendo neste distanciamento forçado.

Nenhum comentário: