Há uma passagem na peça Nossa Cidade, de Thornton Wilder, em que uma personagem conta sobre uma carta que um religioso local enviou para certa Jane Crofut, uma moça que vivia numa fazenda das imediações da cidadezinha onde morava. Sobre o envelope, no lugar do destinatário, ele escreveu:
"Jane Crofut
Fazenda Crofut
Grover's Corners
Condado de Sutton
New Hampshire
Estados Unidos da América
Continente Americano do Norte
Hemisfério Ocidental
Terra
Sistema Solar
Universo
Mente de Deus"
Este sobrescrito na missiva para alguém que vive numa região rural e afastada de tudo chama a atenção para a universalidade das questões humanas. Por mais distante que estejamos dos lugares onde "tudo acontece", somos sempre confrontados com os eternos desafios humanos do sentido da vida, de encontrar um caminho no caos deste mundo, de nossa relação com o amor e a morte. Quando eu morava no lugar pequeno e provinciano onde nasci, tendo vivido a infância numa ruazinha chamada Passa Tempo que nem calçamento possuía, sendo um menino pobre e tendo crescido entre meninos pobres, eu assistia todos os dias, naquela mesma ruazinha de terra, aos mesmos dramas mostrados nas peças de Shakespeare ou nos romances de Machado de Assis. Todas as paixões humanas estavam ali contidas. Por isso não importa muito onde você esteja, mas a sua postura diante dos desafios da vida. Por isso sempre lhe falo da necessidade de ter amigos, refletir sobre seus problemas, respeitar os outros e fazer o que gosta, ainda que essas coisas não lhe tragam dinheiro, sucesso e popularidade. Elas o farão mais humano e lhe proporcionarão mais momentos de alegria. É isso o que vale a pena e o que fica desta nossa precária passagem por este mundo.
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