segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Abolir o grande outro

     É muito citada uma frase atribuída a Dostoiévski, mas que nunca aparece literalmente em sua obra: "Se Deus não existe, tudo é permitido". Em geral, são pessoas que nunca leram o grande escritor russo que a mencionam como uma apologia da fé e como a essência da possibilidade de realizarmos um mínimo de civilização.
     Há alguns anos perdi completamente a fé, se é que algum dia tive alguma. Diante da monumental quantidade de estupidez, alienação, violência, exploração e loucura que há milênios se têm praticado em nome de Deus, me parece que a conclusão óbvia é justamente que se Deus existe, tudo é permitido. Por isso, tenho horror às religiões, em especial na sua forma institucionalizada. Como escreveu Mencken a respeito de uma das versões do cristianismo institucionalizado, o protestantismo, sua maior contribuição à humanidade foi uma prova definitiva de que Deus é um chato.
     Talvez eu esteja escrevendo isso para lhe dizer que tome cuidado com essa praga. Tenha a coragem de ser você mesmo e jamais fazer parte de qualquer forma de rebanho, ainda que isso possa significar algum isolamento temporário. Do mesmo modo, esteja atento a essa forma de religião sem Deus comumente praticada por ateus que substituem o grande outro pelo poder da humanidade, da ciência, de um sistema político redentor, de alguma substância, do líder infalível ou do guru intelectual. É preciso aprender a viver sem esse tremendo fardo sobre nossas costas. 

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