domingo, 12 de junho de 2016

Uma esquina de malucos


     Passei a tarde de hoje na região dos grandes museus, em South Kensington, junto ao Hyde Park. Logo depois perambulei pelo parque. A certa altura, como estava perto da chamada Speakers' Corner, resolvi parar e ouvir os discursos dos vários oradores que ali se reúnem aos domingos para tratar de todos os assuntos, da crise do capitalismo ao sexo dos anjos. É uma das experiências mais pitorescas que se pode ter em Londres. Toda a multiplicidade cultural e ideológica da cidade ali se exprime. E os oradores, sobre seus banquinhos ou caixotes, soltam a língua, em geral falando mal do governo, exaltando suas religiões ou criticando os costumes contemporâneos. O problema é que, embora haja uma boa concentração de pessoas em torno deles, já que o lugar tornou-se inclusive uma atração turística, ninguém os ouve. É comum que seu discurso, que costuma já ser muito confuso, degenere para um diálogo de surdos com algum outro maluco na plateia que resolva debater, mas sendo totalmente fechado aos argumentos do outro. Ao menos hoje lá estava o bom humor esse orador anônimo propondo que não se acredite em ninguém, inclusive nele mesmo.
     A  Speakers'  Corner  existe  há  quase  150  anos,  e  em outras épocas ali discursaram personalidades como Karl Marx, Vladimir Lênin, William Morris e George Orwell. Hoje, porém, num tempo em que todo mundo é obrigado a ter opinião sobre tudo, especialmente sobre aquilo de que não entendem bulhufas, o lugar se tornou um sucesso para quem deseja dar os seus chutes sobre qualquer assunto fora das redes sociais e com uma audiência real.
     Ao  sair  dali,  voltei  para  casa  imaginando  um revolucionário lugar chamado Listeners' Corner, em que as pessoas se reunissem para ficar caladas e simplesmente ouvir, quem sabe discursos gravados de um Martin Luther King, de um Mandela, de um Che Guevara. Ou textos lidos em voz alta de um Montaigne, de um Spinoza, de um Nietzsche. Então partiriam dali para exercer cotidianamente a subversiva prática de ouvir os outros. Com isso, quantos casamentos seriam salvos, quantas amizades não se desfariam, quantos políticos e economistas teriam algum conteúdo em suas falas! E quantos pais e filhos se entenderiam e se respeitariam a despeito de suas diferenças de valores e estilos de vida!

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