domingo, 16 de outubro de 2016

Reinados, congados, Reis


     Minha mãe pediu que minha irmã me enviasse uma foto do congado de Nossa Senhora do Rosário, que passou hoje pela manhã pela porta de sua casa, indo até o asilo de velhos que fica nas proximidades, onde encerrariam seu percurso pelas ruas da cidade e almoçariam. Ela foi vê-los e reavivar lembranças dos seus tempos de menina em regiões rurais do centro-oeste de Minas.
     Embora nunca tenha me envolvido diretamente com eles, eu mesmo, quando criança, vi muito os coloridos grupos de congado e reinado passarem pelo bairro onde morava, com seus tambores, seus acordeons, seus pandeiros, chocalhos amarrados aos tornozelos, danças de bater varas ritmicamente, bandeiras com imagens de santos pintadas à maneira naïf, cantos que se alongam. É o catolicismo mais puro e mais dionisíaco dos negros e pobres, junto aos quais cresci. E havia também as folias de Reis, no dia 6 de janeiro, com suas cantigas tradicionais e os coloridos palhaços a visitar as casas, onde cantavam para atrair proteção durante o ano que se iniciava. Muitas vezes minha mãe abriu a porta de nossa cada para os grupos de foliões, a quem servia café e algum petisco. 
     A  esta  altura,  achei  até  que  esses  grupos  estavam se acabando, uma vez que já na minha infância eles eram formados principalmente por velhos. Ao menos os velhos de minha infância já devem ter morrido quase todos. Mas fico feliz por ver a tradição renovando-se e se mantendo com firmeza neste mundo que está se tornando tão homogêneo em sua "modernidade". Sei que há, em Divinópolis, até mesmo uma missa conga.
     Lembro-me de um reinado ou congado que passou perto da casa de minha mãe há alguns anos, num fim de semana em que eu estava por lá. Ao lado da entrada do asilo de velhos, há também um salão onde realizam velórios. E havia um funeral acontecendo no local quando de repente chegou o cortejo com a música de vários grupos ritmada por seus tambores, além das varas batendo no ar. Foi um grande contraste entre o luto da família e dos amigos do morto e a alegria da festiva comitiva que passava e se estabelecia justamente ao lado do funeral. Vi, naquela cena, o próprio espírito de Minas.

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